O câncer é nosso!
Por: Norbert Suchanek
Um
dia o homem do Brasil vai acordar e descobrir que nióbio não é para comer: Uma
polêmica sobre a febre de nióbio no Brasil e os riscos dos resíduos radioativos
e a concorrência com o Canadá.
“O nióbio é nosso!” Vários
websites, blogs e tweets estão fazendo nesta fase de final de ano uma campanha
para um metal pesado que antigamente foi chamado “Columbinum”, uma homenagem a
um genovês famoso que viajou com uma caravela da Espanha para o Oeste. Os
textos brasileiros de hoje falam: Nióbio, é uma riqueza que o povo brasileiro
desconhece. Mas que o Brasil está vendendo por centavos. Os textos criticam que
um contrabando de nióbio estaria financiando a Rede Globo Minas com a venda subfaturada
de nióbio. E no youtube circula atualmente um filme com o título “Acorda
Brasil! Nióbio: Brasil 98 X Canadá 2″, porque o nosso país produz 98 porcento do
nióbio do mercado mundial e o Canadá somente 2 porcento.
É verdade que o Brasil é o maior
produtor e exportador de nióbio e também dono das maiores jazidas do mundo. E
também é a verdade que vários países industrializados, como China, EUA, Japão,
Alemanha e Coréa dependem das importações deste metal pesado, extraído
atualmente do subsolo de Minas Gerais e Goiás. Este metal pesado e raro é um
componente fundamental dos aços de alta resistência, usados na fabricação de
automóveis, aviões, foguetes, na construção civil e na indústria naval. Ele
também é especialmente importante para a indústria de petróleo na construção de
plataformas de petróleo e na produção de tubulações de óleo e gás. Mais de 30
porcento de todo nióbio produzido mundialmente está sendo usado só para
fabricar dutos!
É muito claro: sem nióbio, a
indústria do petróleo – o grande vilão do meio ambiente – terá problemas. Mas
“o nióbio é nosso!” Com este quase-monopólio do Brasil na produção de nióbio e
a forte demanda, as empresas brasileiras poderiam pedir qualquer preço no
mercado mundial.
Mas a situação é uma outra. Já
por um bom tempo as duas minas de nióbio em operação são privadas e
multinacionais. Quase dez porcento da produção de nióbio do Brasil está
diretamente na mão da empresa chamada Anglo American, proveniente da África do
Sul. “Por meio da Mineração Catalão, Anglo American é uma das maiores
produtoras de nióbio do mundo, com operações nos municípios de Catalão e
Ouvidor em Goiás“, escreve a mineradora poderosa que está no Brasil desde a
ditatura militar, em 1973.
Mas a maior mina de nióbio do
Brasil e do mundo está localizada em Minas Gerais perto da cidade de Araxá. A
Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) é dona desta mina que
produz 90 porcento do nióbio do Brasil. No website da CBMM está escrito: “A
Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, do Grupo Moreira Salles, é uma
empresa nacional que extrai, processa, fabrica e comercializa produtos à base
de nióbio.” Mas isto só tem menos de 50 % de verdade. Já por um bom tempo o
nióbio de Araxá está multinacionalizado. 45 porcento da CBMM pertence à empresa
de petróleo da Califórnia Unocal que é parte da grande concorrente da
Petrobrás, Chevron. Isto faz sentido porque uma empresa de petróleo depende de
dutos e plataformas que precisam de nióbio. Agora desde 2011, outros 30
porcento da CBMM foram vendidos para empresas da China, Japão e Coréa. A
família Moreira Salles ganhou quase 4 bilhões de dólares com esta venda.
E o que ganha a população de
Araxá? Alguns postos de trabalho e provavelmente um banho de radiação elevada e
um alto risco de câncer.
A internet está cheia de artigos
sobre o contrabando de nióbio, a sua venda subfaturada. Mas a mineração deste
metal pesado também tem um lado muito mais escuro e irradiante no mesmo
momento: resíduos radioativos e tóxicos! Uma pesquisa de 1993 feita pelo Instituto
de Radioproteção e Dosimetria da CNEN no Rio de Janeiro concluiu: “Contaminação
interna com material radioativo de trabalhadores de mineração é um problema
comum no Brasil. Isto é causado pela presença de urânio, de tório, e seu
decaimento natural associado com o minério extraído. Os exemplos claros são os
trabalhadores na mina de nióbio localizada no Estado de Goiás. O nióbio está
associado com quantidades consideráveis de urânio e tório, mas a mina não é
legalmente sujeita a requisitos de protecção contra as radiações.”
Esta pesquisa foi feita na mina
de nióbio em Goiás. A mina de Araxá que é dez vezes maior do que a mina da
Anglo American não fez parte desta pesquisa, mas o nióbio de Araxá é também
associado com os mesmos minérios radioativos.
Durante o processo da mineração e
da concentração do minério são produzidas toneladas de rejeitos radioativos que
são depositados em barragens de resíduos. E isto apresenta um alto risco de
contaminação ao meio ambiente e à saúde humana, podendo afetar não apenas os
trabalhadores, mas também a população local. Até hoje apenas poucos autores
falam sobre este risco no Brasil. Um dos poucos é o colunista Gilson B. Santos
do Jornal “A Voz de Araxá“, uma publicação corajosa desta cidade mineira de
Araxá com mais ou menos 95.000 habitantes.
“Câncer – Índice cresce em Araxá!
“Uma coisa é fato hoje em Araxá
–MG, temos um número alarmante de pessoas com câncer e problemas
respiratórios”, escreve Gilson e nomea também a causa: A mineração e
processamento de nióbio. “Solo, água e ar contaminados resultam dos poluentes
liberados da atuação mineradora da CBMM. Não é necessário ser médico ou
especializado na área de saúde ambiental para chegar à conclusão de que dezenas
de milhares de toneladas por ano de poeira abundante em suspensão de ferro,
tório, chumbo, fosfato e demais minerais é deletéria à saúde. Agredida por tais
minerais estranhos à normalidade do funcionamento do organismo humano e
ambiental, a população apresenta aumento de doenças respiratórias juntamente com
doenças degenerativas, demência assim como câncer.”
Em outubro de 2012, Gilson
denunciou mais uma vez na Voz de Araxá: “Câncer – Índice cresce em Araxá!
Chegou a hora de nós araxaenses criarmos vergonha na cara e exigir a verdade de
nossas autoridades sobre os números reais de câncer em nossa cidade. Dados nos
indicam que hoje já são mais de 10.000 casos na cidade, e até 2030 teremos uma
media de mais de 40% da população com a doença em Araxá.”
Por causa deste alto risco de
contaminação, os cidadãos, povos indígenas e ONGs de meio ambiente do Canadá
estão lutando contra a mineração de nióbio neste país. O Canadá já por muito
tempo poderia produzir mais nióbio. Mas desde 2003 os indígenas Mohawk e
canadenses locais lutam contra uma nova mina de nióbio em Quebec. Os Mohawk não
querem que as suas terras e águas sejam contaminadas com os rejeitos
radioativos deste projeto da mineradora Niocan.
No Brasil a situação é ao
contrário. Uma luta contra a mineração de nióbio é quase invisível, só uma luta
a favor da mineração está divulgada em massa. Os lobies do nióbio querem ainda
aumentar a mineração. Até as jazidas de nióbio nos territórios indígenas no
Alto Rio Negro ou na Raposa Serra do Sol podem ser exploradas para enriquecer o
povo do Brasil.
Mas economicamente falando – de
um capitalista para outro – um aumento da produção de nióbio não faz sentido
para o Brasil. Mais uma mina de nióbio significa só mais concorrência com o
resultado de uma depreciação do preço do nióbio no mercado mundial. Só um
idiota cria concorrência em sua própria casa. Também o Brasil já tem Araxá, a
maior mina de nióbio da planeta com a capacidade de abastecer o mercado mundial
para mais de 400 anos!
Claramente as forças
internacionais, as mineradoras e a indústria internacional de aço e de dutos e
da construção civil gostariam ter muito mais nióbio disponível, porque assim o
preço seria mais barato no mercado. Mas isto não é a favor nem da economia e
nem da saúde do povo do Brasil.
Resumo: Por enquanto a situação é
assim: o nióbio do solo brasileiro é para a exportação e enriquecimento de
poucos e o risco de câncer é para a população do Brasil.
“O lucro é deles, o câncer é
nosso!”
Assim o nióbio não é muito
diferente dos outros comodities como soja ou café. As frutas da terras do Brasil
são para exportação, o que fica na terra e nas águas do Brasil são os
pesticidas e adubos químicos, que também podem causar câncer além de outras
doenças mortais. O Brasil é o maior consumidor de pesticidas no mundo, e muitos
destes pesticidas são proibidos exatamente em países que são importadores
destes produtos agrícolas brasileiros.
A maior riqueza do Brasil não são
nióbio, soja ou urânio. A maior riqueza são os rios e as águas subterrâneas
limpas, solos saudáveis e férteis, povos e pessoas tradicionais que ainda sabem
usar a grande biodiversidade das florestas e outros biomas de forma sustentável
e social. Mas tudo isto é uma riqueza em extinção por causa de uma indústria
predatória, insustentável e sem pátria que precisa de elementos perigosos como
o nióbio.
“O nióbio é nosso – deixamos este
minério no solo!”
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