Foi o início da votação de um projeto que regulamenta a terceirização da força de trabalho por empresas, e as relações trabalhistas dela decorrentes, que fez o mundo político recordar que vivemos sob a égide de um sistema dividido por interesses de classe.
Por: Ana Maria Prestes
O primeiro trimestre de
2015 foi marcado por um ambiente político e social tenso e conflagrado. O
terceiro turno eleitoral parecia ter se instalado à revelia da posse
presidencial e do início dos trabalhos do novo governo.
Partidos de oposição,
grande mídia e, até então, ilustres desconhecidas organizações da sociedade
civil articularam uma ofensiva nas ruas, nas redes e na imprensa que parecia
bastante vigorosa e pujante. Um cenário, no entanto, em que as principais contradições
postas à mesa denunciavam certa esquizofrenia política. A forjada contradição
entre os “pró” e “contra” corrupção era estéril.
Eis que ao final deste
primeiro trimestre dá entrada na cena política a mãe de todas as contradições:
Capital x Trabalho. Entrou como um divisor de águas, como uma organizadora da
confusão, dando nomes aos bois e revelando que o principal esvaziamento da base
de apoio ao governo tem razões materiais e objetivas, para além das políticas.
Dona contradição maior, que também atende pelo nome “luta de classes é o motor
da história” chegou quando o capital cobrou sua fatura aos políticos
recém-eleitos. Para chegar ao “paraíso” do parlamento, negociaram direitos
trabalhistas e sociais dos eleitores. Agora retribuem à altura.
Foi o início da votação
de um projeto que regulamenta a terceirização da força de trabalho por
empresas, e as relações trabalhistas dela decorrentes, que fez o mundo político
recordar que vivemos sob a égide de um sistema dividido por interesses de
classe. Uma vez aprovado, sancionado e transformado em lei, o PL 4330 poderá
provocar um aumento do risco de acidentes de trabalho, uma redução nos
salários, no número de postos de trabalho e aumento das horas trabalhadas, além
de uma maior dificuldade para fazer valer a responsabilidade dos empregadores
perante os trabalhadores. Entre as mulheres este impacto pode ser ainda maior,
uma vez que configuram maioria entre terceirizados e recebem somente 80% do
salário dos homens, segundo dados da pesquisadora da Unicamp Juliane Furno em
recente artigo no site Brasil Debate.
A investida contra os
trabalhadores desnudou a oposição e o oportunismo das pretensas bandeiras
anticorrupção. Estas sim difusas e de fácil convocação para mobilizações. Faz
sentido para grande quantidade de pessoas ir às ruas para protestar contra a
corrupção. Mas quando o sujeito percebe que sua ação política pode estar
servindo para legitimar um projeto que desvaloriza e precariza o seu trabalho,
de seus vizinhos, filhos, amigos, irmãos, o “sentido” deixa de fazer sentido.
Não existe ação política que não esteja imbuída de sentido. Mesmo que ele
demore a ser revelado. Cabe à esquerda consciente e comprometida com os
trabalhadores recolocar o embate político no eixo e retomar seu espaço nas
ruas.
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