Por: Gilberto Marigoni*
Má notícia para pessimistas profissionais e hidrófobos em geral.
Estamos tendo um surpreendente ascenso da esquerda nos últimos meses.
É algo espetacular e, à primeira vista, inusitado.
Diante dos arreganhos da ultradireita nas ruas, da manipulação informativa por parte dos monopólios da mídia e da possibilidade de golpe, as manifestações populares têm crescido exponencialmente em todo o país.
TUDO E TODOS - Dos estudantes secundaristas às comunidades universitárias, dos trabalhadores sem teto aos sem terra, das centrais sindicais, às associações profissionais, o Brasil está sendo tomado por um vendaval reativo à pregação regressivo-fascista.
É uma esquerda que tem no centro de suas demandas a questão democrática. Esta se desdobra na luta contra o ajuste fiscal, os projetos de lei lesivos ao funcionamento do Estado e aos trabalhadores, à lei antiterrorismo, ao entreguismo e vários tecéteras.
Cresce a consciência que é preciso deter o golpe sem apoiar os desmandos do governo petista. É uma separação sofisticada, motivada não apenas pelo avanço da direita, mas pelo fato da administração federal ter se mostrado pequena diante do que se esperava dela.
DE QUEM ESTAMOS FALANDO? - Que esquerda é essa, que transborda os partidos e entidades?
À falta de nome melhor, poderíamos denominá-la de "esquerda social". É um bloco que reage ao senso comum - e por isso conservador - dominante. É uma esquerda que disputa hegemonia, num impulso a um só tempo tenso e alegre. Talvez guarde um tanto de pessimismo da razão, mas escancara um formidável otimismo da vontade.
É uma esquerda não-partidária. Não sou daqueles a exaltar tal falto, mas pode ser o substrato de algo novo em gestação. Não é apenas a institucionalidade geral que está em crise. Uma certa institucionalidade progressista, erigida nas últimas quatro décadas, dá sinais de estar batendo lata.
POLITIZAÇÃO ACELERADA - O fato é que a conjuntura desses meses tem apresentado o condão de ser extremamente politizadora. Quem é de direita toma consciência das razões pelas quais luta - podem ser pueris, mas têm fundamento - e o mesmo se dá do outro lado.
É um impulso que mobiliza jovens, velhos, mulheres, homens, gays, índios e outras minorias da imensa maioria dos prejudicados do Brasil. É também uma dinâmica que isola a ultraesquerda purista, cheia de verdades e divorciada das multidões.
Com tudo isso, podemos perder domingo?
Sim, podemos. Mas é bom lembrar que o resultado da comissão do golpe, no Congresso, não foi aquele passeio que Cunha e seus figurantes de trem fantasma avaliavam. Uma vitória por 58% - quando são necessários 66% em plenário - não é aquela cocacola para os golpistas.
Ataques serão redobrados nesta semana. A Lava Jato deve aparecer com algo cheio de efeitos especiais até sexta. Veja, Globo, Folha, Estadão et caterva despejarão aquela gosma desinformativa de norte a sul até o final de semana.
Ganhando ou perdendo, essa esquerda social - que não é nova e que botou muito velho para se manifestar - entrou com alarde na cena política.
É a grande novidade desse outono esquisitão e que deve ficar no ar por muitas estações.
* Gilberto Maringoni de Oliveira é jornalista, cartunista e professor universitário brasileiro. É professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC, tendo lecionado também na Faculdade Cásper Líbero e na Universidade Federal de São Paulo. É ativista político desde 1977. Atuou no movimento estudantil, no final dos anos 1970, tempos finais da ditadura. Foi dirigente do PT, no qual militou entre 1988 e 2005, desligando-se do partido por divergências com seus rumos. Desde então é filiado ao PSOL, chegando a ser membro de sua direção nacional. Maringoni foi candidato a governador do Estado de São Paulo nas eleições de 2014 pelo PSOL.
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