sexta-feira, 17 de abril de 2015


"Esta cova em que estás com palmos medida
É a conta menor que tiraste em vida
É de bom tamanho nem largo nem fundo
É a parte que te cabe deste latifúndio
Não é cova grande, é cova medida
É a terra que querias ver dividida"







Na quinta-feira (16 de Abril), último dia do Acampamento Terra Livre, que começou em Brasília (DF) na segunda-feira, foi marcada por duas sessões solenes, uma na Câmara e outra no Senado, em homenagem ao Dia do Índio. Dispostos a dialogar com os parlamentares das casas onde tramitam propostas legislativas que atacam seus direitos, os indígenas passaram por vários constrangimentos.

Pela manhã, na Câmara, apenas 180 indígenas do Acampamento Terra Livre (ATL) foram autorizados pela mesa diretora da Câmara Federal a participar da sessão no Plenário Ulysses Guimarães. A expectativa era a de que entrassem pelo menos 700 indígenas no Plenário, número que foi reduzido, nas negociações, para 500. Na rampa de entrada para o Congresso, o grupo foi barrado por força policial e dividido em delegações – o que levou muitos a retornar ao acampamento, indignados com o tratamento que receberam naquela que é conhecida como a Casa do Povo.

A sessão teve início, às 10h, com dois outros episódios constrangedores. A ausência do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ), e a censura a um filme sobre as lutas dos povos em Brasília que seria exibido no início da homenagem. Preparado pela Mobilização Nacional Indígena, o documentário trata da PEC 215, razão pela qual acabou censurado.

Apesar de terem iniciado a sessão com cantos e danças dos povos Pataxó Hãhãhãe, Kayapó, Munduruku e Guajajara – logo após a execução do Hino Nacional –, os indígenas não foram tão privilegiados quanto os parlamentares na distribuição das falas.

Sonia Guajajara reconheceu em seu discurso a importância da sessão como um ato democrático, mas criticou de pronto o fato de haver tanto preconceito contra os indígenas na Casa. “Não entendemos por que querem nos invisibilizar. Por que o acordo com aqueles que matam, destroem, roubam? Não podemos permitir que o agronegócio e o capitalismo sejam maiores que a vida. Pedimos respeito aos nossos familiares”, criticou, lembrando que outros projetos anti-indígenas, como o PLP 227/2012 e o PL 1610/96, tramitam na Câmara e no Senado.

O cacique Raoni Metuktire, que, junto com Sonia, era a única liderança a compor a mesa da sessão, pediu que a Casa continue aberta aos indígenas, como aconteceu durante a Constituinte. “Hoje em dia os deputados só querem fazer esses projetos de lei que afetam os indígenas e quilombolas. Eu não aceito esse projeto de lei da PEC 215”, discursou a liderança Kayapó, acompanhado de um tradutor de seu povo.

Alguns deputados destacaram a importância de uma sessão de homenagem aos povos indígenas, depois de a Câmara ter se fechado aos indígenas tantas vezes. Outros afirmaram que a Casa não fazia mais que sua obrigação e que uma concessão de fato seria o arquivamento da PEC, lembrando que tramitam na Câmara apenas dois projetos legislativos favoráveis aos direitos indígenas. Poucos parlamentares participaram da sessão; quase todos membros da Frente Parlamentar de Apoio aos Povos Indígenas (veja a lista), que vestiram a camiseta da Mobilização Nacional Indígena com os dizeres “PEC 215 Não”.

João Tapajós, do Pará, reclamou da restrição ao tempo de fala dos representantes indígenas por região; Davi Kopenawa, xamã do povo yanomami completou: “O branco não deixa falar muito. Ele não quer resolver, por isso que ele não quer deixar liderança falar a verdade”.

Kopenawa foi um dos últimos a falar ao plenário, já quase esvaziado: “Essa casa é a casa da cobra grande. A cobra grande está aqui. Nós queremos matar essa cobra grande; matar, queimar e enterrar para não nascer mais aqui. Fizeram essa lei, sem consulta com ninguém, para matar o nosso povo”. Já o cacique Aritana Yawalapiti, do Xingu, determinou: “Para mim essa PEC já morreu”.

Neguinho Truká pediu que os parlamentares deem menos atenção à PEC desengavetem a tramitação do Estatuto do Índio: “Caso contrário, nós estaremos só nos manifestando e vindo aqui em atos solenes”, frisou. A liderança, que lembrou as demandas dos povos de todos os estados do nordeste, foi duro: “Quando ocupamos essa casa em 2013, ouvimos do presidente que essa era uma casa inviolável. Inviolável é o direito do povo brasileiro, que tem sido negociado aqui dentro. Nós vamos fechar estradas, derrubar torres, ocupar hidrelétricas!”.

Apesar da humilhação na Câmara, Lindomar Terena avalia que foi importante ver os parlamentares afirmando o compromisso com os povos indígenas. No nosso entendimento, isso supera o que a gente passou. A nossa expectativa é que de fato essas coisas sejam colocadas em prática”.

“Não é festa, é cobrança”

No Senado, foi a vez de objetos sagrados, como mbarakás, serem barrados. Os indígenas que se dirigiram ao Plenário para a sessão que começaria às 15h foram obrigados a deixá-los no saguão de entrada do Senado. “O mbaraká [chocalho sagrado] é a fala de ñanderu!”, bradou o cacique Tito Vilhalva, liderança guarani kaiowá. Depois de pressão do movimento indígena, os mbaraká foram liberados.

No início da sessão, aos gritos de “Demarcação já!”, os indígenas demonstraram que não aceitaram o convite para festejar, mas sim para pressionar ainda mais os parlamentares. O presidente Senado, Renan Calheiros (PMDB/AL), assim como Cunha, também não esteve presente na sessão.

Um dos primeiros a falar, senador Vicentinho Alves (PR/TO) discursou sobre sua proposta de criação da Secretaria Nacional dos Povos Indígenas, que já está com parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A proposta foi imediatamente refutada por Sônia Guajajara, reiterando o caráter arbitrário da política, que não levou em consideração a representatividade dos povos indígenas na sua constituição. “Gostaria que Vossa Excelência, em um ato de simplicidade, retirasse a proposta. A Secretaria sequer foi discutida com as nossas organizações e nossas base”, discursou Neguinho Truká.

Sonia lembrou que os indígenas foram barrados ao entrarem na Câmara dos Deputados mais cedo, ainda que tivessem autorização, e apontou para o fato que estão dispostos a dialogar com os parlamentares, mas estão atentos para as suas manobras políticas: “A gente vem, fala e escuta, mas nem sempre deve confiar. Eles falam pra gente uma coisa e agem contra os nossos interesses”.

Sonia faz referência à reunião no final do dia de ontem (15) entre o senador do PSDB, Aécio Neves, com Marina Silva, em que reafirmou seu compromisso de ser contra a PEC 215/00, mas no mesmo dia votou contra os interesses dos povos indígenas na votação do PL 7335/14, que trata do conhecimento tradicional e do patrimônio genético. “O PL foi aprovado na Câmara sem o nosso conhecimento, articulado e construído com o setor empresarial. Ontem no Senado foi justamente o voto do senador Aécio Neves que fez a diferença para aprovação do texto sem as nossas considerações”, ressaltou.

Flávio Chiarelli, presidente da Funai, lembrou do relatório da Comissão Nacional da Verdade, divulgado em dezembro do ano passado, em que foram denunciadas as mortes de mais de 8000 indígenas no período da Ditadura Militar. “Não podemos repetir erros do passado. A Funai foi criada sob uma lógica integracionista e assistencialista com o seguinte pensamento: ‘vamos acabar com os povos indígenas; enquanto não acabamos, oferecemos uma esmolinha aqui, outra ali, confinando em pequenos pedaços de terra‘”.

Após a fala do presidente do órgão, Pirakumã Yawalapiti disse que a Funai precisa ser fortalecida mas não deixou de cobrar o presidente: “A Funai sumiu, toda administração está sucateada e não tem recursos. Nós temos que levantar a Funai. O que tem dentro da Funai é patrimônio indígena. O presidente da Funai não tem mais força porque não visita a gente. Quem pode dar força ao presidente são os povos indígenas”.

No Senado, Neguinho Truká cobrou que os parlamentares presentes não se limitem a fazer alterações no texto da PEC 215, mas que barrem a proposta, e foi ovacionado pelas lideranças indígenas presentes: “Mataram a gente com a Bíblia e com a espada, e hoje matam com leis”, denunciou. Davi Kopenawa fazendo coro ao parente Truká disse que é preciso destruir a PEC 215: “Eu não quero morrer outra vez como morremos 500 anos atrás”.


PLP 227 é inconstitucional e viola Convenção 169






Por: Renato Santana



Na Capital Federal a movimentação no Poder Legislativo já começou. A partir desta terça-feira, 6, os trabalhos no Congresso Nacional devem ser retomados, depois do recesso parlamentar de meio de ano. Entre a quase uma centena de proposições que afetam a vida dos povos indígenas está o Projeto de Lei Complementar (PLP) 227/2012, última novidade da bancada ruralista.

Porém, o PLP 227 é inconstitucional e atenta contra a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A conclusão é de parecer jurídico – leia na íntegra aqui - elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que contou com a colaboração de uma rede de advogados com vivência profissional relacionada ao Artigo 231 – “Dos Índios” - da Constituição Federal. O que diz o PLP 227?  

O PLP 227, já com Comissão Especial formada, pretende criar lei complementar ao artigo 231 apontando as exceções ao direito de uso exclusivo dos indígenas das terras tradicionais, em caso de relevante interesse público da União. Dentre as tais exceções está a exploração dos territórios indígenas pela rede do agronegócio, empresas de mineração, além da construção de empreendimentos ligados aos interesses das esferas de governo – federal, estadual e municipal.

“A questão relacionada à constitucionalidade desta perspectiva normativa relaciona-se ao mérito da proposição que consiste em reconhecer como “atos de relevante interesse público da União”, todos e quaisquer projetos de infra-estrutura e atividades produtivas particulares e públicas, as concessões de terras públicas de faixa de fronteira, os campos de treinamento militares e demais alienações de terras indígenas, “para fins de demarcação de Terras Indígenas”, afirma trecho do parecer, atestando a inconstitucionalidade.

Conforme o documento, empreendimentos ligados a prefeituras e governos estaduais, exploração de riquezas realizadas por empresas privadas e o uso do solo por grupos ligados ao setor do agronegócio não podem ser considerados de interesse público da União, na medida em que não são atos da União. Além disso, o texto ressalta que os deputados constituintes “fixaram sólido e rígido arcabouço jurídico-constitucional no sentido de não admitir quaisquer atos que impliquem restrições à posse permanente e ao usufruto exclusivo dos índios”.

Para os advogados que elaboraram o parecer, as terras indígenas são, conforme o direito originário dos índios, inalienáveis, que já tem destino definido – a posse dos povos indígenas - e não podem ser negociadas; indisponíveis, ou seja, as terras não podem ser disponibilizadas para outras funções, sendo que os direitos dos índios sobre elas são imprescritíveis: podem passar mil anos e tais direitos não perdem a validade. 

“Ao considerar inúmeras atividades econômicas não indígenas e a possibilidade do controle de território indígena por particulares, empresas privadas ou mesmo por Municípios ou Estados Federados, a proposição legislativa desconsidera que o texto refere-se tão somente aos “atos de relevante interesse público da União”. O texto proposto desconsidera o inciso XI do art. 20 da CF/88 que define as terras indígenas como bens da União, e todo o art. 231, principalmente relacionado ao direito originário dos índios, o usufruto exclusivo e que as terras indígenas são inalienáveis e indisponíveis, cujos direitos são imprescritíveis”, diz o parecer. 

Convenção 169 desrespeitada

Ratificada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva em 2004, a Convenção 169 da OIT é outro ponto abordado pelo parecer. “O direito a consulta deve ocorrer também diante de medidas legislativas que afetem os povos indígenas. Além da inconstitucionalidade, o PLP 227 desrespeita essa convenção, que a partir da hora que o país torna-se signatário passa a ter efeito como lei”, explica o assessor Jurídico do Cimi, Adelar Cupsinski. A medida, portanto, atua em consonância com a Constituição Federal.

“A Convenção 169 da OIT não limita quais os temas que os povos indígenas devem ser consultados como, por exemplo, a exploração de recursos minerais em terras indígenas ou os atos de relevante interesse público da União. Ao contrário, afirma que sempre que medidas legislativas ou administrativas possam afetá-los diretamente esses grupos étnicos devem ser consultados. Trata-se, portanto, de medida que guarda perfeita consonância com a Constituição da República ao reconhecer aos índios sua organização social, usos, costumes e tradições e estabelecer o dever da União Federal em fazer respeitar todos os bens dos povos indígenas (art. 231, caput)”, diz trecho do parecer.  

No entanto, a Convenção 169 amplia a participação dos povos indígenas na vida do país para além da consulta prévia. De acordo com a línea b do artigo 6º da convenção, “em todos os níveis decisórios de instituições eletivas ou órgãos administrativos responsáveis por políticas e programas que lhes afetem”. Isso significa, tal como lembram os advogados no parecer, que o Congresso Nacional precisa, ao menos, aprovar o Projeto de Lei (PL) 3571/2008, que cria o Conselho Nacional de Política Indigenista, hoje apenas uma comissão, a CNPI. “O Congresso tem o dever de consultar os povos em todas as fases do processo legislativo. Estamos diante de um projeto (PLP 227) altamente danoso aos povos indígenas e a democracia”, encerra Cupsinski. 

Leia o parecer naíntegra aqui.   


Sobre a PEC 215


Via: Mobilização Indigena

Desde abril do ano passado, a PEC 215 tem sido motivo de uma onda de protestos por todo país, desde que um grupo de índios ocupou o Congresso Nacional para barrar o projeto. A proposta foi então tema de uma comissão paritária entre indígenas e parlamentares, que concluiu pela sua inconstitucionalidade e recomendou o seu arquivamento. O Governo Federal se posicionou contra a medida e juristas renomados como Dalmo Dallari e o próprio ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso, já alertaram para a sua inconsistência jurídica. Em dezembro de 2013, no entanto, a bancada ruralista conseguiu a instalação de uma Comissão Especial para tratar do tema.

A audiência desta sexta-feira na Alesp é a última de série promovida pela Comissão Especial em várias regiões do país, e não conta com a participação de povos indígenas, organizações apoiadoras, e tampouco de especialistas na temática, como foi regra em todas já realizadas. O clima nas oitivas nos outros Estados foi tenso. Relatos de observadores que estiveram presentes na sessão ocorrida em Belo Horizonte (MG), por exemplo, testemunharam falas de pessoas contrárias à demarcação de terras, que chegam a tratar os índios por “vermes e vagabundos”, sem quaisquer reparos por parte dos parlamentares que coordenavam o evento.

O ato de hoje ocorre um dia depois que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) divulga posicionamento público explicando porque nenhum dos povos indígenas do país se dispôs a participar e legitimar as referidas audiências, que já passaram pelos estados de Santa Catarina, Pará, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia e Minas Gerais. A nota também é assinada pela Comissão Guarani Yvyrupa (CGY).


Sobre a Bancada Ruralista




Maior bancada no Congresso Nacional, com 162 deputados e 11 senadores (segundo reportagem da Carta Maior) sob a sigla de Frente Parlamentar da Agropecuária, a chamada bancada ruralista representa os interesses de empresas e proprietários de terra no país, um negócio que movimenta R$440 bilhões entre a produção agrícola e pecuária. Os parlamentares da bancada ruralista, muitos dos quais são também grandes proprietários de terra e tiveram suas campanhas financiadas por empresas ligadas ao setor, estão vinculados a diversas propostas legislativas que restringem os direitos dos índios e criminalizam a reforma agrária.

O site “A República dos Ruralistas” reúne informações sobre financiamento de campanha, patrimônio e ocorrências judiciais dos principais deputados e senadores que compõem a bancada e revela quais propostas apoiam ou rechaçam.

Através do site podemos saber, por exemplo, que o Deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), o mesmo que foi flagrado em vídeo conclamando grandes proprietários a se organizarem através de suas redes de contatos para reunir “verdadeiras multidões” e expulsar “do jeito que for necessário” os que ousarem pisar em suas terras, votou a favor das mudanças no Código Florestal e contra a PEC do Trabalho Escravo.

Outro que teve seu perfil divulgado no site é o Deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS), que considera índios, negros e homossexuais “tudo o que não presta” em nossa sociedade. Heinze também foi contra a PEC do Trabalho Escravo e trabalha intensamente contra as demarcações de terras indígenas. Curiosamente o deputado teve sua campanha em 2010 financiada por empresas como a Bunge Fertilizantes S/A, a Camil Alimentos S/A, Seara Alimentos S/A, dentre muitas outras gigantes do agronegócio. Senadores como Kátia Abreu, e Blairo Maggi também tem seu perfil apresentado no site.


A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, de interesse da Frente Parlamentar Agropecuária, é inconstitucional e deve ser arquivada.




A PEC 215 visa levar ao Congresso Nacional as demarcações de terras indígenas, quilombolas e a criação de áreas de preservação ambiental para serem aprovadas ou não. Por conta dela, entre outras medidas nocivas às comunidades originárias e tradicionais, os povos indígenas ocuparam em abril o plenário da Câmara Federal.

Na ocasião, o presidente da casa, deputado Henrique Alves (PMDB/RN), criou a comissão paritária – composta por dez parlamentares e dez lideranças indígenas. O grupo de trabalho deveria ser um espaço de discussão sobre todas as proposituras legislativas envolvendo os povos indígenas. São quase 100 matérias, no total.

Porém, apenas as lideranças indígenas e parlamentares fora do escopo do agronegócio compareceram. Inclusive na sessão desta quarta, que votou o relatório final do grupo. Para Lincoln Portela (PR/MG), mediador da comissão, a ausência durante os meses de trabalho se deu por conta da intensa agenda legislativa.

O encerramento da comissão, entretanto, ocorre nos dias prometidos pelo presidente da Câmara Federal para a criação da Comissão Especial da PEC 215, medida rechaçada por indígenas, indigenistas e juristas. A comissão é a ante-sala da votação em plenário, tomado por deputados ruralistas interessados na PEC.

Justamente por essa razão, 1.500 Terena bloquearam durante esta quarta as BR-262 e BR-060, na região central do Mato Grosso do Sul, contra a criação da Comissão Especial da PEC 215. Em Dourados (MS), os Guarani Kaiowá trancaram parcialmente a MS-156, deixando apenas uma faixa de rolamento livre.

“Agora foram os parentes Terena e Guarani Kaiowá que pararam três rodovias, mas se essa Comissão Especial for criada, todos os povos indígenas do país vão se movimentar e vamos parar o país. A gente não aceita essa PEC e os interessados nela não quiseram conversa”, declarou o cacique Neguinho Truká, de Pernambuco.

Tabuleiro

Com a votação do relatório final e o fim do grupo de trabalho, que deverá migrar para uma subcomissão da Comissão de Legislação Participativa da Câmara Federal, o presidente Henrique Alves tem o que precisa para criar a Comissão Especial da PEC 215. Mesmo com parecer pela inconstitucionalidade, nada impede Alves de criar a comissão.

O presidente da Câmara declarou que caso não fosse estabelecido um consenso no grupo de trabalho, a Comissão Especial da PEC 215 seria criada. “Se não vingar, se não corresponder à nossa expectativa do entendimento, eu vou sim pautar, vou criar a comissão especial”. A tática dos ruralistas foi de não comparecer às reuniões do grupo de trabalho.

Por outro lado, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), solicitou informações à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal sobre a PEC 215. Para Barroso acabou caindo o mandado de segurança com pedido de liminar do deputado Padre Ton (PT/RO) contra a tramitação da PEC 215.

As lideranças indígenas esperam que o ministro Barroso, assim como outros juristas de renome, como Dalmo Dallari e Carlos Frederico Marés, entenda a PEC 215 como uma afronta à Constituição Federal, que este ano completa 25 anos e ainda está longe de ser a Constituição Cidadã – tal como era desejado em 1988.


Mineração em Terras Indígenas






Aprovado em 1996 pelo Senado, o PL 1610 de autoria de Romero Jucá (RR), tem como objetivo cumprir com uma exigência formal estabelecida na Constituição Federal, que admite a atividade de mineração em Terras Indígenas, desde que se crie um dispositivo constitucional que regulamente essa atividade por meio de lei.

Uma das críticas à aprovação do PL é que a questão seja contemplada no Estatuto do Índio, paralisado desde 1994, e não isoladamente, em uma lei específica, como foi proposto por Jucá.

O trabalho foi retomado criando-se uma nova comissão especial destinada a proferir um parecer sobre esse projeto de Lei. De acordo com o deputado federal Édio Lopes, relator do parecer, o substitutivo deve prever a consulta pública dos povos indígenas a respeitoda exploração mineral em suas terras; a participação da comunidade indígena noresultado da lavra; e a autorização do Congresso para a atividade. Em outubro deste ano, a Rede de Cooperação Alternativa, do qual o ISA faz parte, publicou uma nota de repúdio à aprovação do relatório de Lopes.

O foco do debate sobre o substitutivo é a validade dessas consultas públicas. O não consentimento das populações indígenas afetadas pelos processos de mineração não é decisivo para sua implementação. Ou seja: se após as discussões em conjunto com a Funai a população indígena se opuser à mineração em suas terras, o projeto não será barrado. Ele deve ser encaminhado a uma comissão deliberativa, composta por representantes do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), da Funai, do Ibama, da Câmara e do Senado, que decidirá sobre a melhor alternativa para a comunidade.

Para a elaboração do parecer, o relator Lopes, juntamente com outros integrantes da comissão, visitou três países Austrália, Canadá e Equador, buscado subsídios e exemplos de regulamentação de mineração em Terras Indígenas. Somado a isso, no Brasil, foram ouvidas diferentes populações indígenas à respeito do tema, mas o consenso parece um horizonte distante.




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